terça-feira, novembro 15, 2005

Sonho meu...

Subi a pequena colina sem dificuldade. Do outro lado, esperava-me um mundo novo, mas com sabor a antigo. Um frenesim de recordações que á muito desejava.

O primeiro efervescer de sentidos disparou com o simples cheiro de pão, que cozia num forno no cimo de um palanque montado numa armação de ferro e madeira.

Uma senhora de idade vestida de preto que subia os degraus do palanque, abraçava penosamente um sem numero de galhos finos, penso que para atear outro forno. Embora subisse com alguma dificuldade, um ar sereno formava as linhas do seu rosto.

O Ti’ Zé das Azenhas, homem alto e de poucas conversas, passava no trilho mais abaixo, embrenhado nos seus pensamentos. Nas suas mãos largas e escuras assentavam uma enxada, uma saca de serapilheira amarela, repleta de folhas de couve Portuguesa amadurecidas, e ainda sobre o seu ombro pendiam cuidadosamente equilibradas, algumas boas duas dúzias de cabeças de nabo com rama.

Ao longe, como quem olha o horizonte, um bando de pardais saltitava por entre as poças da chuva de ontem. O bater das suas asas molhadas que reflectiam os raios do sol lá alto, emitia um bonito brilho intermitente, tal qual as estrelas da noite.

Aida, a irrequieta filha do criador de cabras, passeava-se por entre os campos de flores, saltaricando cuidadosamente por entre os rebentos, enquanto olhava para baixo tentando localizar alguma cor ainda ausente no ramalhete, que segurava cuidadosamente nas suas pequenas mãos. O chapéu de palha com fita vermelha, bailava ao sabor dos pequenos saltos, e o vestidinho rosa com cinta branca imaculado tal a veste domingueira, ondulava ao sabor do ameno e morno vento que se fazia sentir. O mesmo que transportava o aroma prazenteiro de alguns enchidos que esfumavam devagar, ali mesmo ao lado na casa do forno da senhora Olinda, a mesma da banca dos chouriços e do pão de quilo, airosamente posicionada na Praça Nova, que de nova só tinha o nome.

A tasca da vila, era por todos conhecida. Onde para além do vinho que os mais idosos bebiam sofregamente, se podiam comprar ou trocar também produtos alimentares, ferramentas hortícolas, e diversas quinquilharias bem posicionadas nas prateleiras forradas em papel de embrulho. O balcão de mármore era talvez, a única zona clara naquele ambiente taciturno, moderadamente iluminado por uma lâmpada no centro do tecto e a escassa luz do sol.

Uma jovem com ar superior, mostrava-se por entre as ruas da vila, habilmente alheia a tudo que a circundava. Óculos escuros, um bloco de folhas sobreposto numa pasta negra que descansava em cima dos braços, e um par de sapatos pretos polidos, eram o suficiente para se destacar dos demais. Dizia-se pertença da Câmara Municipal, mas o que fazia era olhar as paredes e as parcas instalações dos esgotos com desdém, enquanto rabiscava a ainda primeira folha do seu bloco com ar de novo.

Na rua principal avançavam algumas senhoras, com feixes de feno dourado metodicamente equilibrados na cabeça, e alguns petizes corriam em volta das mulheres tentando atrapalhar a passada. Um cão preto e magrizela circulava no passeio de calçada, com um olhar tenro e curioso, abanando gentilmente a cauda curta e farfalhuda, enquanto cheirava os troncos dos imponentes carvalhos, ali cuidadosamente depositados para dar sombrear os bancos de jardim, apinhados de verdete. Alguns vasos coloridos assentados nos beirais, amimavam os olhos de quem os miravam. Reuniam uma colecção exótica de vegetais, com uma variedade difícil de igualar.

Para além do elementar burburinho tradicional, podia ouvir-se também a roda de um aparelho de afiar facas, deslizando por entre eixos muito polidos e pouco oleados. Casualmente, o passado negro do viveiro da casa na esquina, dava sinal de vida, pipilando grotescamente sons demasiado desconformes, mas sendo na mesma motivo de orgulho do dono, talvez mais pelo seu tamanho.

Do alto da serra, podia ver de uma forma distinta, aquele agrupado de casas pequenas e brancas, com telhados empenados, e ruas estreitas. As pessoas, pequenas como formigas, deambulavam vagarosamente, sem pressa do amanhã, por entre o cheiro de chouriços da senhora Olinda, o brilho dos atados de trigo dourados, e o bonito som do roçar das folhas nos milheirais.

 

WWW...

Gosto de navegar. Gosto de explorar a net. De encontrar o que procuro. Mas as dificuldades que encontro levam-me a pensar...

Como é que ainda nos deparamos com todos aqueles imprevistos, quando tentamos ver algum site?

Desde pop-ups, a entrar em sites que nada têm a ver, ao constante pedido para instalar isto, e instalar mais aquilo, quando não fazemos a mínima ideia do que estamos a instalar. Depois os acréscimos, ou seja, instala-se isto porque é necessário, mas no mesmo pacote temos mais uma barra de navegação, mais isto, mais aquilo…???...

Claro que já não estou a falar em vírus, porque isso ainda iria dar que falar até ao natal (…de 2008…).

E o que me espanta nisto tudo, é que tudo isto existe livremente. Qualquer pessoa, com os conhecimentos necessários, é capaz de fazer o que quer e lhe apetece, e nós utilizadores, somos literalmente obrigados a lidar com tudo isso, e sem nos podermos queixar a ninguém.

Claro que existem os anti-pop-up’s, os antivírus, mas até estes só podem aparecer depois do mal instalado. E não existe conhecimento de nenhuma intervenção policial a esta ou aquela pessoa, por ter colocado um vírus na net. Isto claro, se existem leis em Portugal para esse efeito, o que não acontece.

Compreendo que existam vírus para aqueles que tentam entrar em sites proibidos, e até quem tenta sabotar, de uma maneira ou de outra, algo que não lhes pertence. Mas a navegar, e a aparecer constantemente os problemas acima referidos…

A Net move milhões de pessoas, e como tal, muito dinheiro. E claro, desde que ele continue a entrar, ninguém se chateia, e quem vier atrás que feche a porta… Enfim.

E resumidamente, aqui fica o meu descontentamento expresso, porque não, no veiculo de todos estes “extras”.

 

Como escrever um bom texto

1. Deve evitar ao máx. a utiliz. de abrev., etc.

2. É desnecessário fazer-se empregar de um estilo de escrita
demasiadamente rebuscado. Tal prática advém de esmero excessivo que
raia o exibicionismo narcisístico.

3. Anule aliterações altamente abusivas.

4. não esqueça as maiúsculas no inicio das frases.

5. Evite lugares-comuns como o diabo foge da cruz.

6. O uso de parêntesis (mesmo quando for relevante) é
desnecessário.

7. Estrangeirismos estão out; palavras de origem portuguesa estão
in.

8. Evite o emprego de gíria, mesmo que pareça nice, tá fixe?

9. Palavras de baixo calão podem transformar o seu texto numa
merda.

10. Nunca generalize: generalizar, é um erro em todas as
situações.

11. Evite repetir a mesma palavra, pois essa palavra vai ficar uma
palavra repetitiva. A repetição da palavra vai fazer com que a
palavra repetida desqualifique o texto onde a palavra se encontra
repetida.

12. Não abuse das citações. Como costuma dizer um amigo meu:
"Quem cita os outros não tem ideias próprias".

13. Frases incompletas podem causar

14. Não seja redundante, não é preciso dizer a mesma coisa de
formas diferentes; isto é, basta mencionar cada argumento uma só
vez, ou por outras palavras, não repita a mesma ideia várias vezes.


15. Seja mais ou menos específico.

16. Frases com apenas uma palavra? Jamais!

17. A voz passiva deve ser evitada.

18. Utilize a pontuação correctamente o ponto e a vírgula
especialmente será que já ninguém sabe utilizar o ponto de
interrogação

19. Quem precisa de perguntas retóricas?

20. Conforme recomenda a A.G.O.P, nunca use siglas desconhecidas.

21. Exagerar é cem milhões de vezes pior do que a moderação.

22. Evite mesóclises. Repita comigo: "mesóclises: evitá-las-ei!"


23. Analogias na escrita são tão úteis quanto chifres numa
galinha.

24. Não abuse das exclamações! Nunca! O seu texto fica horrível!


25. Evite frases exageradamente longas, pois estas dificultam a
compreensão da ideia nelas contida, e, por conterem mais que uma
ideia central, o que nem sempre torna o seu conteúdo acessível,
forçam desta forma, o pobre leitor a separá-la nos seus diversos
componentes, de forma a torná-las compreensíveis, o que não
deveria ser, afinal de contas, parte do processo da leitura, hábito
que devemos estimular através do uso de frases mais curtas.

26. Cuidado com a hortografia, para não estrupar a língúaa
portuguêza.

27. Seja incisivo e coerente, ou não.

28. Não fique escrevendo no gerúndio. Você vai deixando seu texto
pobre -causando ambiguidade - e esquisito, ficando com a sensação
de que as coisas ainda estão acontecendo.

29. Outra barbaridade que você deve evitar é usar muitas
expressões que acabem por denunciar a região onde tu moras, carago!

 

sexta-feira, novembro 11, 2005

Hotel Rwanda

Ano de 1994. Rebenta a Guerra no Ruanda.

Para termos uma ideia certa do que é uma guerra, tínhamos que viver uma. O que felizmente, não acontece em Portugal.

Por muito que veja nos média, sei que não tenho a mínima noção do que é uma guerra. E sei porquê. Agora, neste exacto momento, estou a escrever no meu PC, tenho uma aparelhagem áudio mesmo aqui ao lado que me custou mais de 2.000€ e para além da TV e do Vídeo, também tenho água para me lavar, e se tiver fome, vou ao frigorifico e sirvo-me do que me apetecer, e se quiser…

Sahira Mulehdin acordou de madrugada com um som ensurdecedor. Uma bomba havia rebentado a poucos metros da cumbikira* onde dormitava. Levantou-se com um salto. Lá fora podiam ouvir-se algumas pessoas que corriam em todas as direcções.
Sahira olhou pelo buraco que servia de janela. Zayyano, o seu vizinho, encontrava-se ajoelhado no chão tentando reanimar o seu filho de oito anos. Algumas casas encontravam-se completamente destruidas, restando apenas uma nuvem de pó iluminada pelas chamas. Sahira colocou uma mão no peito. A sua pequena filha Adama encontrava-se sentada no cesto que lhe servia de berço. Brincava com uma caneca de barro, Não chorava. A sua atenção era totalmente direccionada ao pequeno objecto que tinha entre mãos. Ouviram-se mais alguns estrondos, seguidos de gritos dos habitantes da aldeia. O primeiro gesto de Sahira foi pegar na sua filha ao colo, e correr em direcção à savana. No outro extremo da aldeia ouviam-se os guerrilheiros que acabavam de chegar. Sahira colocou-se no meio de alguns arbustos e aguardou pacientemente até que a manhã chegasse. O resto da noite foi passado a tentar abrigar a sua filha do frio que se fazia notar, enquanto se tentava acomodar na terra empedrada onde se tinha sentado. Antes do amanhecer, começou a chover impediosamente. Nada mais lhe restava senão tentar esconder Adama o melhor que podia. De manhã levantou-se devagar, tentando desentorpecer as pernas que quase não sentia. Com Adama nos braços onde dormia profundamente, foi desbravando o terreno por entre a lama e as ervas molhadas. Ao entrar na aldeia, algumas lágrimas decresceram da sua face. Só uma casa tinha ficado de pé. O resto da paisagem tornara-se repentinamente consternador. Algumas pessoas tentavam animar os feridos que se encontravam no chão frio. Não existiam medicamentos para os poder tratar, por isso para além de alguns panos por cima das feridas, só algumas plantas escolhidas pelo feiticeiro local pareciam atenuar as dores.

Uma senhora já com uma certa idade agarrou-se aos braços de Sahira, chorando e tentando obter uma explicação para o que havia sucedido. Não existia tal... Sahira acabara de perder tudo o que tinha. O seu mundo, como o conhecia, tinha mudado completamente. Não tinha roupa, não tinha loiça, não tinha nada senão o que trazia no corpo. E não tinha ninguem a quem se queixar. E agora?...

Hoje, posso imaginar-me na seguinte situação:

Estou em casa, são 21h, acabei de jantar, e sentei-me confortavelmente a ver TV. O ambiente é tranquilo e sereno, como o filme que estou a ver. Ao meu lado tenho um copo com um Chivas 12 anos, sem gelo, como se quer. A janela está semi-aberta e dela provém uma brisa suave, quase que feita à medida para entrar naquela sintonia ambiental. O filme é subitamente interrompido e uma cara conhecida do telejornal aparece com ar alarmado. Os olhos de choro, contrastando com o normal, dizem-me que o assunto é grave.
- Portugal entrou em guerra!! – são as suas primeiras palavras. (...) Quando acaba aquela breve intervenção, a televisão fica escura, e eu entro em pânico.
Os meus primeiros pensamentos são dispares, sem sentido, e eu com tanto que fazer, e sem saber por onde começar. A sala encontrava-se em silêncio, até ser quebrado por algumas aeronaves que sobrevoam muito baixo. Alguns segundos depois, a noite torna-se dia, seguem-se sons ensurdecedores e o cheiro a fumo instala-se junto com a poeira. Corro para a porta da saída, ainda sem saber para onde ir, e o que fazer... Já na rua, encontro o caos plenamente instalado. Carros batidos, casas que ardem indiscriminadamente e algumas pessoas, que como eu, ainda tentam saber o que aconteceu. Corro, sem saber para onde ir, e deparo-me com outras pessoas que correm na direcção contrária que também não sabem onde se dirigem... A poeira que paira no ar limita-ma os movimentos, e o cheiro a morte começa a fazer-se sentir, e eu continuo, ainda sem saber para onde, procurando talvez, uma realidade alternativa que me traga tudo de volta. Mais alguns aviões passam, e deixam um rasto de destruição atrás. O que antes era calmo, o que inspirava ao civismo, desapareceu.

Na minha cabeça, existem algumas perguntas: “Quem começou isto? O que terá motivado tudo isto? Porquê?...”

Sahira dirige-se agora ao Uganda. Caminha por uma estrada de terra seca, muito árida, onde a poeira com cheiro a fumo lhe invade a alma a cada passada. Deixou para trás uma vida, a sua. Agora, pergunta-se a quem pode pedir respostas, a quem pode perguntar se lhe vão restituir a casa, a roupa, e tudo o resto, e se quem começou tudo aquilo, lhe pode apagar as memórias de tão infeliz noite. Noite, noite que dificilmente se tornará dia.

*Cumbikira - Casa

 

sexta-feira, novembro 04, 2005

Proximizade

Proximidade e mão amiga. "Proximizade", feita do entusiasmo voluntário de quem quer ajudar a combater a apatia, a dispersão e a insensibilidade que nos ameaça se continuarmos indiferentes ao que se sabe e ao que se vê.
Aqui, já está a acontecer

Solidariedade. Uma palavra grande, mas que significa muito mais. Não custa nada fazer uma visita e pelo menos ler o que está escrito, para que nos possamos lembrar de todos que não estão tão bem quanto nós.